terça-feira, 26 de junho de 2012

Um mineiro no Chile - Parte 5


26 de junho de 2011

Panorâmica da Estação de Esqui de El Colorado (Foto: Lucas Conrado)


Meu último dia no Chile! Esse feriado prolongado passou voando!

Não são nem 9h da manhã e já estou com a Bruna na porta da Estação de Quinta Normal, esperando o metrô abrir. Já saímos atrasados do El Punto, rumo ao outro lado de Santiago, de onde saem as vans para El Colorado, uma estação de esqui a poucos quilômetros da capital chilena. Hoje abriu a temprada de esqui de 2011! Fizemos muito bem em ir para o litoral no fim de semana.

Aliás, esquiar não é o meu objetivo em El Colorado. Isso até causou uma certa “discussão” com a Bruna, porque ela achava que não valia a pena eu subir até a estação e não esquiar. Mas, cara, alugar o equipamento é caro. Pagar pela aula de esqui é ainda mais caro. E só tenho um dia para aproveitar na neve, então não quero perder esse único dia tomando aulas. Com a Bruna convencida disso, partimos rumo a El Colorado!

Estou muito ansioso por chegar. Além de toda ansiedade para realizar um sonho de infância, minha pressa se justifica por um medo totalmente irracional. Está um sol absurdo, sem uma única nuvem no céu. Não sei como é no Chile, mas no Brasil, o gelo derrete quando está exposto ao sol. Os níveis da neve nos Andes estão mínimos! Imagina chegar lá em cima e ver que a neve derreteu! É irracional, eu sei, mas o medo está na minha cabeça.

O silencioso metrô com pneus de Santiago.
(Foto: André de Virgilis)
Como eu disse lá no primeiro dia em Santiago, o metrô da cidade é bem diferente do metrô brasileiro. Isso porque suas rodas não são de metal, são pneus. Isso faz ele ser muito mais silencioso que o nosso. E, naquele domingo, estava um silêncio absurdo.

BRUNA – Reparou numa coisa?

EU – O que?

BRUNA – Os chilenos estão todos calados.

Olho para cada pessoa no metrô e é verdade! Os chilenos têm uma fama de serem fechados. Fama justificada a primeira vista. Eles estão todos calados, olhando para o chão, mal mal um cochicha no ouvido do outro. Parecem ser sonâmbulos!

Mas, um adendo, apesar da fama, os chilenos estão longe de serem fechados. Puxe conversa com um deles, que eles tratam com grande simpatia e atenção. Até falam espanhol mais devagar, se você não estiver entendendo.

Descemos na zona oeste da cidade e andamos alguns quarteirões de uma grande avenida até chegar à loja de materiais para esquiar. Em sua porta estão várias vans. É, o trânsito para as estações de esqui será carregado! Dentro dela há de tudo. Esquis, snowboards, botas, óculos, toucas, agasalhos impermeáveis... há de tudo para passar um dia esquiando sem se preocupar com nada. Para variar só um pouco, eu e a Bruna não somos os únicos brasileiros ali. Há uma família de cariocas escolhendo seu equipamento. Eles também vão para El Colorado.

A graça dessa estação de esqui é que você pode entrar nela mesmo que não queira esquiar. E o melhor, a entrada é gratuita! Só paga quem vai esquiar! Obviamente, o transporte até a estação tem seu custo, mas a entrada não! Perfeito!

A van faz uma parada rápida num posto, onde as pessoas compram algumas coisinhas na loja de conveniência. Com as comidas compradas, avançamos rumo à Cordilheira dos Andes! Além das ansiedades que falei ali em cima, há outra coisa na minha cabeça. Na verdade, uma preocupação. Enquanto ia pro Chile, ouvia o Nerdcast sobre Seleção Natural, Artificial e Evolução. Nele, o Átila dizia que pessoas que vivem perto do mar se sentiam muito mal no alto dos Andes. Sentiam tonteira, falta de ar, coração disparado. Já estou subindo os Andes com essa tossezinha chata, que me acompanhou por toda viagem ao Chile, não quero passar mal.

A Cordilheira dos Andes! (Foto: Lucas Conrado)
Mas, cara, ver a cordilheira assim de perto, tira qualquer preocupação da cabeça. A estrada sobe fazendo intermináveis curvas. Sempre que vou pra Minas, subo a Serra de Petrópolis, repleta de curvas. Ela não é nada perto da estrada que sobe os Andes. Passamos por rios, abismos, e uma vista espetacular. Se as montanhas já impressionam vistas de Santiago, ali, de perto, são ainda mais espetaculares.

Na nossa van, está a família de cariocas que vi na loja lá embaixo. Enquanto converso com a Bruna, não deixo de ouvir a conversa deles. De repente, o cara sentado logo atrás de mim fala de uma garota, acho que sua sobrinha, que estuda Moda em alguma faculdade carioca. Então ele conta que a menina vai largar o curso, porque passou para Comunicação Social na UFRJ e as aulas começam em agosto. Olha só, o cara conhece uma futura caloura minha.

Continuamos subindo. A neve, cada vez mais próxima... mais próxima... mais próxima... De repente, começamos a ver pequenas porções de neve nos cantos da estrada. Mais um pouco, as porções crescem. Poucos minutos depois, ela está dominando a paisagem! É algo espetacular, não parece real! Parece coisa de parque de diversões! Inesquecível!

Mais um pouco, chegamos a um vilarejo, com diversas casas de madeira e pedra cobertas de neve. Farellones parece um cenário de filme! Cinco minutos depois, estamos Muita gente caminha em direção ao prédio, carregando esquis e snowboards! Chegamos a El Colorado!

Nossa van abre a porta e as pessoas começam a descer. A Bruna busca algo em sua bolsa e fala para eu já descer. Nem discuto. Desço e vou na direção da neve, empurrada para o canto da estrada. Está sujinha, mas que seja! É neve! Gelada, quase branca, e fofinha... fofinha? Piso no bloco de neve e meu pé não afunda. Forço o bloco e nada... Tomara que a neve do outro lado do prédio seja mais fofinha.

Nosso querido Júlio Verne, congelando a bunda na neve!
(Foto: Lucas Conrado)
Entramos em El Colorado e guardamos nossas mochilas no guarda volumes. Levo só a minha inseparável câmera, o Júlio Verne (meu ornitorrinco de pelúcia e mascote do meu blog) e o trenó que o Décio nos emprestou. Saímos pela varanda de madeira e, 50 passos depois, finalmente pisamos na neve!

Agora sim, neve de verdade! Branquinha, gelada, fofinha! Os pés afundam no gelo a medida que andamos. Minha bota faz direitinho seu papel. É impermeável, então ando por ali sem problemas. A Bruna já não tem a mesma sorte. Seu tênis é permeável e em poucos minutos, os pés estão molhados e frios.

Não conseguimos tocar na neve com as mãos desprotegidas. Ela é tão gelada, mas tão gelada que chega a queimar! Pego um punhado e tento fazer uma bola pra tacar na Bruna. A neve esfarela na minha mão. Me lembro da Carol, uma grande amiga minha da faculdade. Ela me disse isso mesmo, que a neve se esfarela toda! Será que não vai dar pra fazer o boneco de neve? Que triste! Outra coisa interessante são os torrões. Você pega um torrão de neve e ele pesa muito menos que um torrão de terra, do mesmo tamanho. Você faz a mira para arremessá-lo em uma estaca a três metros de você. Calcula a força do arremesso, pensando nos torrões de terra e, ao jogá-lo, ele voa muito mais alto! É muito engraçado!


Triste nada! Tiramos centenas de fotos, nos jogamos na neve, brincamos, pulamos, caímos! É uma coisa inexplicável! Muito gostosa! Naquela hora, eu percebo que tudo valeu a pena! É o ponto alto da minha viagem, uma das coisas mais legais que fiz em minha vida.

Propaganda de agência de viagens!
(Foto: Lucas Conrado)
Ah, antes que eu me esqueça, não sinto nada no alto dos Andes. Tonteira, dor de cabeça, coração disparado... Não estou sentindo nada. A Bruna pega o trenó e propõe que brinquemos com ele. Vamos sim. Vamos para uma pista de esqui que não está em uso e subimos uns 50 ou 60 metros. Cara, que subida cansativa! Deve ser a dificuldade de pisar na neve que está provocando esse cansaço.

A Bruna senta no trenó, ele afunda na neve. Ela se levanta, anda para outro lugar e se senta novamente. Afunda de novo. Ela me entrega e vê se consigo usá-lo. Ele não é rígido. É feito de um plástico grosso, mas maleável que afunda quando nos sentamos sobre ele. Ao invés de sentar, me deito de barriga. Com um impulso, começo a ganhar velocidade... Quando assusto, estou descendo de trenó na neve!

Tomado de excitação, termino a descida e olho para a Bruna com um sorrisão no rosto. Não penso duas vezes, saio correndo na direção dela, para entregar o trenó. Um dos maiores erros da minha vida.

No meio da corrida, começo a sentir falta de ar. O coração parece que vai explodir no meu peito de tanto que bate. Mais alguns metros, a vista começa a escurecer. O que é isso? Chego perto da Bruna caminhando e, ao entregar o trenó para ela, caio de costas na neve, prestes a desmaiar! Não é frescura de jogador de futebol! Não dá pra correr na Cordilheira dos Andes! Como não tinha sentido nenhum efeito da altitude até então, nem ouvido entupido, me esqueci que estava a 3500 metros de altitude! Corri e me arrependi!

Descendo de trenó! (Foto: Bruna Acácio)


Recuperado da falta de ar, volto a brincar com a Bruna, alternando as descidas de trenó. A subida é feita com cautela, para evitar esses problemas novamente. Em uma dessas descidas, uma turista brasileira, de esquis nos pés, me pergunta:

TURISTA – Onde você arrumou esse trenó?

EU – Em Santiago.

TURISTA – Me diz onde você comprou?

EU – Não, na verdade, um amigo emprestou.

TURISTA – Poxa, aluguei esses esquis, paguei as aulas e não consigo sair do lugar! Que inveja!

Ainda bem que não aluguei os esquis. Depois de enjoarmos de descer de trenó, subimos um pouco mais pela pista onde estávamos descendo. Aqui e ali, pego porções de neve onde não vejo pegadas nem rastros de esqui e chupo. Ela é gostosa. Não sei explicar o gosto, mas é muito boa! Cara, a neve é perfeita! Que pena que não tem dela no Rio!

Golden Retriever: Sonho em forma de cachorro.
(Foto: Lucas Conrado)
Mais um pouco acima, paramos para descansar. Do alto da montanha vem um dos cachorros mais bonitos que eu já vi! Um golden retriever gigantesco, que havíamos visto mais cedo com uns esquiadores! Ele vai pra cima da Bruna, que está sentada na neve, louco pra brincar com ela. Logo depois, anda na minha direção, abanando o rabo todo feliz! Passo a mão em suas costas e ele vai embora. Meu sonho é ter um cachorro desses.

A hora do almoço está chegando e estamos com fome. Com dificuldade, voltamos para a estação para comer algo. A Bruna trouxe comida de Santiago, então não pega nada pra comer. Eu quero um sanduíche. Pão, carne, salada, e abacate! Beleza! Uma batata chips e uma Coca-Cola pra acompanhar! E custando “apenas” 15 mil pesos! Perfeito! Pago isso pensando que estou pagando 15 reais. Ledo engano. 15 mil pesos é a bagatela e 60 reais!

Repare no saco de batatas fritas, a esquerda! (Foto: Lucas Conrado)
Um detalhe rápido: você percebe como a pressão atmosférica é menor ali ao olhar para o pacote de batatas-fritas! Ele, embalado muito abaixo, está inflado como um balão! Não dá pra abrir de uma vez, tem que rasgar um cantinho, deixar o excesso de ar sair, para então poder abri-lo e comer as batatas!

Nossas meias secando ao sol... Ou não!
(Foto: Bruna Acácio)
De barriga cheia, vamos fazer a digestão fora de El Colorado. Atravessamos o estacionamento e a rua da estação e vamos para uma construção que parece ser uma lojinha que está fechada. Estamos na varanda dessa suposta lojinha, onde há algumas cadeiras e uma linda vista de Santiago, lá embaixo. A Bruna está com os sapatos muito molhados e os pés muito gelados. Ela, então, tira os tênis e pendura as meias no parapeito, para que possam secar no sol que está brilhando no alto dos Andes. Meus pés não estão muito molhados, mas um pouco de neve entrou na minha bota. Vejo as meias dela secando ao sol e penso "por que não?" Tiro também as minhas meias e coloco pra secar! Perfeito!

Depois de quase meia hora conversando, decidimos voltar ao parque. Pego as minhas meias. Estão muito mais geladas do que na hora que as tirei. Isso não é um bom sinal. Calço o par e tenho a impressão de estar ainda mais molhadas do que na hora que eu tirei. Um pouco depois, não sinto os meus dedinhos. Mas que ideia genial essa de colocar minhas meias para secarem!

Voltamos ao parque e, na base de uma das pistas fechadas, encontramos um tipo diferente de neve. Ela é mais grudenta, dá para moldar coisas, como a bela bola que acabo de arremessar na Bruna! Assustada, ela revida e assim começa nossa primeira guerra de bolas de neve.

Nossos casacos são impermeáveis, então não sentimos o frio das boladas. Mas a touca não é. Acerto uma bola de neve na cabeça da Bruna e ela não gosta da brincadeira. Com razão, o gelo vaza pela touca e queima a cabeça. Desculpa aí!

A guerra esfriou (literalmente), então decidimos fazer um boneco de neve! Vamos empilhando o gelo, formando o corpo do boneco. Pegamos um bloco e colocamos logo acima do corpo, é a cabeça. Com dois torrões arredondados, se formam os olhos. Outro torrão, mais alongado é o nariz. Os galhos formam os braços e uma pedra no peito é sua gravata! Ele é feio, todo torto e só mede uns 60 centímetros de altura. Está longe de ser aqueles bonecos de neve que vemos nos filmes, mas é nosso filho! Seu nome? Nelmo! Feito de Neve e é a cara do Elmo, da Vila Sésamo. Nome autoexplicativo!
Nosso filho: Nelmo! (Foto: Autor desconhecido)

Deixamos nosso filho viver sua vida de boneco de neve e vamos partir para outra aventura ainda maior. Enquanto brincávamos com o trenó, víamos uma casinha, lá no alto da montanha. Então, vamos tentar chegar nela? Vamos!

Começamos a subir a pista de esqui "abandonada". Aqui e ali descem alguns esquiadores, mas nada que nos coloca em perigo. É uma subida muito cansativa. A medida que avançamos, a neve é mais alta. Aliás, há lugares com a neve mais alta, em outros, ela é mais baixa. Chegamos a afundar até o joelho dentro dela.

Vamos avançando aos poucos. A cada, sei lá, 100 metros, talvez menos, nos deitamos no gelo e tomamos ar. É uma experiência muito cansativa. Estamos no alto dos Andes, num lugar gelado, mas o agasalho impermeável, especial para a neve, não nos deixa transpirar. Então, é engraçado, apesar daquele frio todo, estamos suando!


Avançamos mais um pouco. Nos deitamos na neve. Tomamos ar. Andamos mais um pouco. Nos sentamos para tomar mais um pouco de ar. Então voltamos a andar... E nesse vai e para, vamos subindo cada vez mais alto e cada vez mais perto da casinha. Bem próximos do nosso objetivo, há um lugar que a subida se torna mais íngrime.

BRUNA – Essa descida vai ser ótima na hora que estivermos voltando de trenó!

Sim, estamos planejando descer de volta para El Colorado em cima do trenó! Tomara que dê certo! Depois de um esforço sobre humano, finalmente conseguimos chegar à casa! O mais impressionante é que ela não está sequer na metade da montanha!

A vista é linda! De um lado, a Cordilheira dos Andes se estendendo de uma ponta à outra do continente. Logo ali, encravada na montanha, há um pequeno vilarejo coberto de neve, coisa que só vemos em filme. Lá embaixo, bem pequenininha, a sede do El Colorado. Ainda mais abaixo, Santiago, coberta pelo eterno smog. Um avião sobrevoa, solitário, o céu dos Andes e não há ninguém perto de nós! 


A Bruna escreve no chão seu nome, uma homenagem à sua avó e o nome de sua turma. Eu, por outro lado, tirei uma daquelas fotos típicas de alpinista quando chega ao topo de uma montanha. Peguei minha bandeira de Minas Gerais e fiz a foto no "topo do mundo".

Momento alpinista, no alto da Cordilheira dos Andes! (Foto: Bruna Acácio)

OK, está ficando tarde. Só teremos tempo de descer para pegarmos a van. Tiramos o trenó da sacola, o colocamos na neve fofa e nos sentamos em cima dele, afundando pateticamente. Tentamos nos sentar em posições diferentes para distribuir melhor o peso, mas não adianta nada. Caminhamos até o ponto mais íngrime da descida e nos sentamos novamente. Faço força com meus pés, mas o trenó desliza apenas alguns centímetros na neve. É... vamos ter que descer a pé!

O que sobrou do Nelmo: Uma garrafa com neve!
(Foto: Lucas Conrado)
Como diz o ditado, para baixo todo santo ajuda! Numa "viagem" muito menos cansativa e muito mais rápida, chegamos à base da pista de esqui um pouco antes das 17h, hora combinada para a van voltar para Santiago. Ao chegarmos na base, uma surpresa desagradável: O Nelmo, nosso filhinho de neve foi brutalmente assassinado. Perto dele, vários bonecos de neve. E ele é o único destruído. Então, me passa uma ideia pela cabeça: Pego a garrafa de água que a Bruna havia bebido e a encho de neve! A neve do nosso querido Nelmo! Essa é a lembrança dos Andes que vou levar ao Brasil!

Enquanto o sol se põe, descemos os Andes. E estou comendo o melhor biscoito de chocolate branco que já tive o prazer de experimentar. Ele parece aquele biscoito "tortinhas" vendido no Brasil, mas vem com chocolate branco de verdade, não aquela massa aleatória que vendem como chocolate branco!

Chegamos em Santiago e já está de noite. Estamos exautos, suados e loucos por um banho! Mas, não podemos ir diretamente ao El Punto. Na volta ao Brasil, quero comprar algumas coisas. Além do presente do meu pai, que ainda não achei, quero levar a geleia chilena supergostosa, os biscoitos de chocolate branco, o Doritos integral que o Motokane, um amigo do Canal Futura pediu, além do Pisco, uma espécie de cachaça chilena que o Léo, meu ex-chefe havia pedido também.

Entramos numa galeria, onde há um supermercado pequenininho, meio estilo Zona Sul. Até que há algumas coisas que quero comprar ali, mas não é tudo. A Bruna me fala que há outro maior ali perto, então fazemos parte das compras ali e deixamos o resto para o outro.

O segundo mercado já é bem maior e tem uma cara de Extra ou Pão de Açúcar. Nele, encontramos tudo que queríamos comprar. Aliás, quase tudo. O tal do Doritos integral não existe ali. Aliás, em nenhum dos lugares que entrei nas cidades que visitei, existia o tal do Doritos integral. Desculpa, Márcio, mas vai ficar pra próxima.

Esqueci de contar no trecho de Valparaíso, mas, enquanto caminhávamos pelo porto, a Bruna me perguntou o que meu pai gostava. Num rápido brainstorm, decidimos que o presente ideal para ele era uma bela garrafa de vinho chileno!

Estamos na frente da prateleira de vinhos, olhando as garrafas de Casillero del Diablo. São tantos tipos diferentes, que nós, praticamente desconhecedores de vinhos, não sabemos escolher o que pegar.

BRUNA – Que tipo de vinho seu pai gosta?

EU – Mais suave... doce, sei lá.

BRUNA – Que tal esse aqui? Diz que é bom para comer com queijo. Seu pai gosta de queijo?

EU – Gosta... queijo minas, mussarela, queijo prato no pão... Não sei se combina muito.

BRUNA – E esse? Diz que é pra beber com peixes, será que ele vai gostar?

EU – Acho que ele não é muito fã de peixe...

BRUNA – Esse aqui é recomendado para se beber com saladas e carne. Seu pai come carne e salada, não é?

Na boa, para mim não faz muita diferença tudo aquilo, até porque minha família não é muito de fazer refeições especiais para acompanhar vinho. Acabamos levando o das carnes e da salada mesmo, junto com o Pisco e as outras coisas. Na saída do mercado, passo numa banquinha que está vende joias e compro um colar para minha mãe. OK, acabou a sessão de compras! Vamos embora, descansar, tomar um bom banho e jantar, para arrumar as malas!

Meu voo de volta está marcado para as sete da manhã. Mas, como devo chegar no aeroporto com duas horas de antecedência, a van vai passar no El Punto por volta das 4h. Mal vai dar tempo de dormir! Chegamos no El Punto e fomos tomar banho. 

Saio do banheiro vestindo apenas uma camisa de manga comprida e uma calça. Nada mais para cobrir o corpo. Morei 14 anos em São Paulo, então já conheço bem esse friozinho que tô sentindo agora. Aliás, nem está tão frio assim. Acho que essa blusa vai dar conta do recado.

Ao voltar ao quarto da Bruna, ela me diz que vai cozinhar para mim naquela noite. Macarronada e frango grelhado! Delícia! Na hora que vamos descer para a cozinha, percebo que meu chinelo ficou no Brasil. Com preguiça de calçar os tênis, peço um par emprestado à Bruna.

BRUNA – Só tenho esse aqui, serve?

EU – Serve sim!

BRUNA – Mas é rosa.

EU – Tanto faz... O importante é que não vou pisar no chão gelado.

BRUNA - Você é quem sabe.

E só com a blusa de manga comprida e os chinelos rosa da Bruna, desço com ela até a cozinha. Ao chegar lá, começo a sentir vergonha e enfio meus pés debaixo da mesa rapidinho. Tem um pessoal do Brasil ali, assim como alguns argentinos. Todos muito legais. Mas, a medida que a conversa avança, o friozinho que eu sentia ao sair do banheiro se transforma num friozão. Começo a tremer violentamente de frio! A Bruna vê isso e corre comigo pro quarto andar, para abrir o quarto.

Pronto, agora, devidamente agasalhado e com meus tênis no lugar dos chinelos, volto à cozinha. Ali, converso com uma garota de La Plata, na Argentina, e outra do Sul do Brasil. Conversa vai, conversa vem, eu ouço alguém entrar na cozinha e, às minhas costas, falar espanhol, com um sotaque chileno forte.

É o Jaime, o administrador do El Punto. Ele está ali, a dois metros de mim! Ele continua falando com um dos moradores. Se me vir, é expulsão na certa! Olho para a brasileira na minha frente e o olhar dela diz tudo. A tensão na cozinha é tão grande, que dá pra tocá-la no ar.

Quando ele termina de falar, algo que eu não entendi, viro a cabeça lentamente e meus olhos se encontram com os dele. Ele me dá um sorriso de boa noite, pisca um olho e vai embora! Simples assim!

Terminamos de jantar (Bruna, se você ler isso, saiba que cozinha muito bem) e voltamos para o quarto, para fazer as malas. Compro as encharpes na mão da Bruna e termino de trocar boa parte dos pesos que me sobraram por reais, na mão da Bruna. Afinal, se eu fosse trocar no aeroporto ou no Brasil, teria um prejuízo absurdo. Troquei com ela na cotação que havia trocado os reais que levei ao Chile pelos pesos, na casa de câmbio do centro de Santiago. Com tudo isso resolvido, a Bruna pega uma mala de mão e diz:

BRUNA – Você pode levar essa mala, por favor? Vou estourar e muito a minha cota de bagagem, e você está levando menos coisas. Além disso, você pode levá-la como bagagem de mão, não vai dar problemas...

EU – Você tem certeza? Ela parece meio grande...

BRUNA – Tenho, sim. Eu trouxe essa mala como bagagem de mão... tá tranquilo.

EU – Se não vai dar problema, tudo bem... levo sim. 

BRUNA – Obrigada! Quando eu for na sua casa pro Rock in Rio, eu busco!

OK, agora não tem mais jeito. É aquele clima de fim de festa, ou melhor, fim de viagem. O que eu tinha pra aproveitar, já aproveitei. O que não consegui ver, fica para a próxima. Dali a poucas horas, a van da Transvip ia chegar. Era hora de dormir um pouco para madrugar no aeroporto.

Chile querido, foi um prazer te conhecer! Muito obrigado por ter sido palco da melhor viagem da minha vida...

Amanhã, a última parte da viagem.

Um comentário:

David disse...

Muito bom o post Lucas, parabéns
www.likechile.com/blog