Por Roberto Drummond.
Aline tinha 12 anos e queria falar com Deus. Todos a conheciam como a menina do arranha-céu, pois Aline morava num edifício tão alto, debruçado sobre uma favela, que tinham a impressão de que, se ficasse na ponta dos pés, podia estender a mão e colher uma estrela para transformá-la num broche. Aline era uma menina cheia de vaidade, usava piercing no nariz, maquiava o rosto, e não queria saber de namorados da mesma idade. Nas noites de lua, Aline tentava falar com Deus e gritava no alto da cobertura onde morava:
- Você está me ouvindo, Deus? Me arranja um namorado bonito como o galã da novela das oito!
- Jesus, Maria José - ralhava a empregada Lulude, que veio do interior de Minas - Isto são modos de se falar com Deus, Aline?
- Deixa de ser tonta, Lulude - dizia Aline. - Deus é da minha tribo, sua boba.
- Vou contar pra sua mãe, Aline - ameaçava Lulube. - que você está chamando Deus de índio.
Aline tinha uma luneta com a qual esperava ver Deus. Aline olhou a favela fizinha do arranha-céu com a luneta e viu, na porta de um barraco, uma menina de sua idade.
A menina era negra e soltava uma pipa. Aos poucos, Aline aprendeu a gostar da menina, sem conhecê-la. Durante a noite grupos rivais trocavam tiros na favela e Lulude fechava as janelas com medo das balas perdidas. Aline perdia o sono, escutando o tiroteio, e pedia a Deus que nada acontecesse à menina da favela. Os soldados costumavam invadir a favela e o tiroteio aumentava nessas noites. Uma tarde, a menina da favela soltou uma pipa vermelha, onde estava escrita a palavra "PAZ", em letras grandes, e Aline gritou, com a voz mais alta que podia:
- Deus, toma conta da menina da favela!
Um dia, de tanto que tentou, Aline conseguiu falar com Deus.
- Tudo bem, Aline? - perguntou uma voz muito bonita, vinda do céu.
- Tudo bem - respondeu Aline - Quem é você?
- Eu sou Deus - disse a voz que vinha do céu - Posso atender um pedido seu, Aline.
- É você mesmo, Deus? - festejou Aline. - Quero um namorado bonito como o Reinaldo Gianecchini.
- Pode aguardar, Aline - prometeu Deus.
Aline perdia o sono esperando a chegada do príncipe encantado. Virava na cama enquanto ouvia o tiroteio e sentia pena da menina da favela. Gostava tanto da menina que pediu ao pai que a levasse à favela, quando a guerra dos grupos rivais acabasse, só para conhecê-la. Uma noite os soldados invadiram a favela e Aline sentiu edo e abraçou-se com o travesseiro. Os tiros eram tantos que Aline se lembrou do bombardeio de Bagdá, que viu na televisão, quando era mais novinha e dos combates entre palestinos e judeus na Faixa de Gaza. Ficou tão impressionada que chegou na janela e gritou em meio ao tiroteio:
- Está me ouvindo, Deus?
- Estou, Aline - respondeu Deus.
- Queria mudar meu pedido, Deus - gritou Aline. - Em vez de mandar o Reinaldo Gianecchini, queria que Deus protegesse a menina da favela.
De repente, como se Deus não estivesse gostando do tiroteio entre os soldados e os grupos rivais na favela, relâmpagos clarearam o céu e a chuva caiu. Até um ponto que a fúria de Deus calou as metralhadoras e os fuzis e Aline ouviu a voz de uma menina que cantava na favela. Cantava uma canção linda, nunca antes ouvida por Aline, como se fosse um anjo cantando. Um anjo negro disfarçado numa menina da favela vizinha do arranha-céu onde mora Aline que conversa com Deus.
Aline tinha 12 anos e queria falar com Deus. Todos a conheciam como a menina do arranha-céu, pois Aline morava num edifício tão alto, debruçado sobre uma favela, que tinham a impressão de que, se ficasse na ponta dos pés, podia estender a mão e colher uma estrela para transformá-la num broche. Aline era uma menina cheia de vaidade, usava piercing no nariz, maquiava o rosto, e não queria saber de namorados da mesma idade. Nas noites de lua, Aline tentava falar com Deus e gritava no alto da cobertura onde morava:
- Você está me ouvindo, Deus? Me arranja um namorado bonito como o galã da novela das oito!
- Jesus, Maria José - ralhava a empregada Lulude, que veio do interior de Minas - Isto são modos de se falar com Deus, Aline?
- Deixa de ser tonta, Lulude - dizia Aline. - Deus é da minha tribo, sua boba.
- Vou contar pra sua mãe, Aline - ameaçava Lulube. - que você está chamando Deus de índio.
Aline tinha uma luneta com a qual esperava ver Deus. Aline olhou a favela fizinha do arranha-céu com a luneta e viu, na porta de um barraco, uma menina de sua idade.
A menina era negra e soltava uma pipa. Aos poucos, Aline aprendeu a gostar da menina, sem conhecê-la. Durante a noite grupos rivais trocavam tiros na favela e Lulude fechava as janelas com medo das balas perdidas. Aline perdia o sono, escutando o tiroteio, e pedia a Deus que nada acontecesse à menina da favela. Os soldados costumavam invadir a favela e o tiroteio aumentava nessas noites. Uma tarde, a menina da favela soltou uma pipa vermelha, onde estava escrita a palavra "PAZ", em letras grandes, e Aline gritou, com a voz mais alta que podia:
- Deus, toma conta da menina da favela!
Um dia, de tanto que tentou, Aline conseguiu falar com Deus.
- Tudo bem, Aline? - perguntou uma voz muito bonita, vinda do céu.
- Tudo bem - respondeu Aline - Quem é você?
- Eu sou Deus - disse a voz que vinha do céu - Posso atender um pedido seu, Aline.
- É você mesmo, Deus? - festejou Aline. - Quero um namorado bonito como o Reinaldo Gianecchini.
- Pode aguardar, Aline - prometeu Deus.
Aline perdia o sono esperando a chegada do príncipe encantado. Virava na cama enquanto ouvia o tiroteio e sentia pena da menina da favela. Gostava tanto da menina que pediu ao pai que a levasse à favela, quando a guerra dos grupos rivais acabasse, só para conhecê-la. Uma noite os soldados invadiram a favela e Aline sentiu edo e abraçou-se com o travesseiro. Os tiros eram tantos que Aline se lembrou do bombardeio de Bagdá, que viu na televisão, quando era mais novinha e dos combates entre palestinos e judeus na Faixa de Gaza. Ficou tão impressionada que chegou na janela e gritou em meio ao tiroteio:
- Está me ouvindo, Deus?
- Estou, Aline - respondeu Deus.
- Queria mudar meu pedido, Deus - gritou Aline. - Em vez de mandar o Reinaldo Gianecchini, queria que Deus protegesse a menina da favela.
De repente, como se Deus não estivesse gostando do tiroteio entre os soldados e os grupos rivais na favela, relâmpagos clarearam o céu e a chuva caiu. Até um ponto que a fúria de Deus calou as metralhadoras e os fuzis e Aline ouviu a voz de uma menina que cantava na favela. Cantava uma canção linda, nunca antes ouvida por Aline, como se fosse um anjo cantando. Um anjo negro disfarçado numa menina da favela vizinha do arranha-céu onde mora Aline que conversa com Deus.
4 comentários:
que bonito
cara to de boca aberta! Foi vc que escreveu? cara muito doido....
Não não. Quem escreveu foi o Roberto Drummond.
Muito bom esse post e o seu Blog, Lucas. Que Deus continue te abençoando cada dia mais, Paz!
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